quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Descansa em paz e protege-me dai de cima

De todo, hoje não foi o meu melhor dia nos últimos tempos. Acordei tarde e assim que me levantei fui almoçar pois já era hora de o fazer. Até ai estava tudo bem, mas a partir de mais ou menos a meio da tarde , lembrei-me do significado deste dia. Não me lembrava , confesso. O que é estranho porque há dias que ando a pensar como reagir a este dia e ás pessoas que iram estar comigo e perceber o quanto me iria rebaixar.Mas por acaso , nem me lembrei. Só quando me perguntaram que dia era hoje e eu descontraída respondi. "10 de Agosto". Mas após segundos me apercebi do quanto este dia me magoa. O que aconteceu neste dia e as quantas lágrimas infinitas que deitei e  vi deitar.
A dor de perder alguém próximo é horrível.E quando caímos em nós mesmos e a meio daquele choro nos apercebemos que essa pessoa vai, mas já não volta entramos em pânico. E ficamos assim durante algum tempo. Ficamos na solidão de um desespero , mas não é por estarmos sem ninguém à volta para nos apoiar. Mas sim porque nos começamos a aperceber do que podíamos ter feito com essa pessoa e não fizemos. Daquilo que lhe podíamos ter dito e não dissemos. O que é certo que chegamos a um ponto que não queremos saber de nada nem de ninguém e que sorrir não é o gesto mais habitual diariamente. Mas tudo passa. Tudo vai e acabamos por esquecemos a dor. Ou se calhar não, provavelmente não seja uma  questão de doer menos , mas sim de suportar melhor a dor. Acho que é isso mesmo, acabamos por nos acomodar e a viver com ela diariamente. Temos que recomeçar a nossa vida e deixar os choros e desesperos para trás , pois não é isso que me irá ter vontade de viver o que a vida me dá. Mas precisamos de arranjar forças para passar por cima. Precisamos de algo ou alguém para nos darem forças. E nesses pequenos momentos é que vemos que gosta realmente de nós e não nos deixa por nada. Quem está do no nosso lado e quem nos ajuda e apoia em qualquer circunstância. 
O que é certo é que tive que me acomodar, tive que aprender a lidar com a tua morte e tive que ser forte e dar força à minha mãe e à minha avô que foram as pessoas que sofreram mais. Nós três estávamos juntas nesta tempestade. Estávamos no mesmo barco e tínhamos que saber sobreviver a este furacão que destroçou muitos corações.
Lembro-me perfeitamente deste dia. Estava no Algarve e estava a 2 minutos de embarcar no barco para ir para a praia,assim que a minha avô liga à minha mãe ás 9h da manhã. Assim que percebi que era ela, já sabia o que estava a acontecer. Já sabia que já não estavas entre nós e que tinhas partido. A dor de ver a minha mãe a chorar desesperadamente foi algo que eu nunca tinha visto antes. Algo que me marcou de uma maneira inesquecível. Eu não chorei naquele preciso momento, não o fiz durante instantes. Mas assim que vi toda a gente a correr para o carro para voltarmos para o Alentejo, e percebi que ninguém via os meus olhos encheram-se de lágrimas. Não consegui conter, mas limpei-as imediatamente. Tive que me manter firme. Tive que meter a mascara de forte e de aço, aquela que aparenta nada me afectar. 
Assim que cheguei lá e vi o teu corpo num caixão, entrei numa solidão tremenda E só existia 3 pessoas, tu a mãe, e a avô. Eram as únicas com que eu me preocupava. Preocupava-me contigo , porque não sabia se a sentis-te muita dor ao partir, e preocupava-me com elas porque tu eras um pilar na vida delas. Aquele dia foi um autêntico inferno , e a noite ultrapassava isso. Passei a noite naquela capela horrível em que estavam imensas pessoas , mas que nem metade delas estavam sentidas com a situação em questão. Umas estavam ali apenas para passar o tempo, o que me deixou fora de mim e me fez sair dali. No momento, não consegui dar força a ninguém porque não a tinha. Não conseguia arranjar força para nada e só me apetecia desaparecer por estar a ser tão inútil.Foi uma noite horrível, das piores que tive até agora. Não me lembro de conseguir dormir, ainda por cima tive que dormir na tua cama. Tal como ainda hoje durmo quando ai vou. Sinto-me em paz e segura ali, mas naquele dia aquela cama era a ultima em que me queria deitar. Mas mesmo assim, teve que ser e tive que me deitar lá.
Faz hoje precisamente um ano que nos deixas-te , e ao pensar nisso fico triste.Embora nós não fossemos muito chegadas, éramos um pouco. Nunca falei muito contigo e quando era pequena não te dizia as coisas mais queridas, confesso. Era uma pita parva e não gostava de te ver sentada a olhar para mim e a reclamar comigo com a bengala na mão. Até acho que já te disse que te odiava e tudo. Naquela altura nem eu sabia o significado da palavra odiar. E como é óbvio nunca te odiei nem nunca o irei fazer. Mas eu não te dava importância, para mim eras mais uma velha que tinha que ver todos os dias a olhar para mim o dia todo sem se levantar do mesmo sitio. 
Mas há uns 7 anos para cá , deixei de ser assim. Foste para aquele lar em que hoje em dia tenho que passar sempre que lá vou , e ficas-te melhor ali do que naquela casa completamente sozinha. Mas a tua hora tardava mas chegava ,e acabou por chegar. E sinceramente , já não aguentava ver o teu olhar cheio de dor e sofrimento. Já não aguentava ter que te ver naquele estado. Por essa mesma razão é que eu detestava lá ir, e também pelo aspecto daquele lar. Odiava ver velhos quase a cair de mortos a olhar para mim fixamente.  Muitas pessoas pensavam que era porque eu não gostava de ti, mas essas pessoas enganam-se. Eu gostava e continuou a gostar imenso de ti. E tenho imensas saudades tuas. Tenho saudades de me pores a mão na perna e perguntares se estava tudo bem. Porque podia não parecer mas eu achava-te uma mulher fantástica. Mas a velhice chega a todos e um dia chegará a minha vez. Está é para muito mas muito em breve.
O teu funeral foi algo que me custou imenso ver. Em cada passo que dava lembrava-me das poucas memorias que tinha tuas. Mas não chorava, eu contia e conseguia. Estava com o meu pai que por incrível que pareça chorou à minha frente. E que nesse momento frente aquele caixão , me abraçou e disse "Ela tinha de ir". Eu chorei mais ainda mas não tive coragem de olhar mais para aquele caixão. Foi muito duro , não por mim mas por ver o sofrimento da minha avó. Porque na verdade , mãe é mãe , e eu não me imagino a perder a minha.
Passaram-se os meses e a dor parecia estar a desaparecer. Lembro-me de uma vez, ao fim do dia de ir ao cemitério ver a tua campa , sozinha. Fui sozinha,estava a escurecer e estava frio.Entrei e estava pouca gente. Sentei-me na campa do meu avó , pois a tua ainda não estava montada. E fiquei ali, a falar contigo. Estive ali bastante tempo , e chorei imenso. E só tu vias e ouvias. Era ali que eu me sentia em paz e segura. Fui para casa, e a caminho limpei todas as lágrimas que ainda escorriam pelo resto duma menina inocente e triste. Assim que cheguei estava toda a gente à minha espera e interrogavam-se pelo meu paradeiro nas ultimas horas.Eu apenas disse "Estive a passear por ai , mas pronto já cheguei". Não disse a ninguém e até hoje ninguém sabe que lá fui. Não o voltei a fazer, pois me faltou a coragem. Mas talvez volte a passa por lá e me sentar desta vez, na tua campa. Ainda não disse à minha mãe a tal frase "Hoje faz 1 ano que a avó morreu". Ainda não tive essa coragem, mas já disse ao meu pai e ele ignorou e nem sequer respondeu.
Embora tenha deitado milhões de lágrimas a escrever este texto, quero que saibas que não estou a sofrer. Apenas tenho imensa pena de não te ter aqui comigo a acompanhar o meu crescimento. Foste uma das pessoas que tomou conta de mim enquanto eu era criança e já me fez muito feliz em tempos. Obrigada por tudo o que já fizeste por mim e desculpa todos os imensos e numerosos erros que já cometi contigo.
Esteja onde estiveres espero que estejas bem. Eu continuou aqui a proteger todos aqueles que amo e que também te amavam a ti. Continuo a desempenhar o papel de menina forte. Quero que saibas que a tua partida foi uma das situações que me deu mais força. O que não nos mata , deixa-nos mais fortes. Continua a proteger-me dai de cima que eu sei que tu és o meu maior anjo da guarda. 
Obrigada por tudo o que já me deste , e desculpa todas as minhas imensas parvoíces.
Continua a descansar e a proteger-nos de longe, que eu desempenho o meu papel de perto;bisavó.


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